Eu tenho a expectativa que o Observatório possa ser um lugar onde possamos aprofundar os rumos que novos campos do saber-fazer têm oferecido à assistência no campo sanitário. Há muitos aqui, mas quero me referir ao movimento hospice, que tem buscado legitimar um espaço, a partir de suas ferramentas conceituais e práticas, dentro do modelo biomédico de cuidados no fim da vida. Uma interface aparentemente promissora, mas que tem seus desconfortos, desconfianças e contradições, onde uma luta é travada – muitas vezes de modo velado – em cenários de intervenções continuadas, persistentes, como é o caso dos hospitais tradicionais gerais. Uma crescente parcela de pacientes solicita, menos verbalmente, e mais pelos dramas diários que vivem, um olhar mais ampliado sobre o significado da doença e o modo como lidamos com este significado, especialmente quando estamos diante de uma doença avançada, sem tratamento curativo. E há, ainda, o movimento dos defensores da eutanásia, tão acanhado por aqui – debate socialmente interditado? -, mas que não podemos desconsiderar sua força nas sociedades onde já se legitimou socialmente como prática médica.
Outro aspecto que vejo importante como reflexão para o Observatório é sobre as consequências da incorporação dos incríveis avanços tecnológicos, engendrando uma força persuasiva quase irresistível no dia-a-dia da atividade médica – e que tem reflexos diretos, também, na questão suscitada no parágrafo anterior. Talvez sejamos levados a constatar que a tão repetida “arte médica” (o que é isso mesmo?) tenha nos abandonado, se é que esteve conosco algum dia, ou estejamos vivendo seu crepúsculo. Talvez a medicina venha firmemente caminhando para ser um instrumento da técnica como um fim em si mesma, que exige cada vez mais médicos competentes com seu instrumento de trabalho e performáticos, ainda que, muito pertinentemente nos lembre Daniel Callahan (1990) que termos que enfrentar uma contradição que isto nos tem trazido e que se avoluma em nossa frente, a de que “(…) nossas vitórias sobre nosso adoecimento e [sobre a] morte são sempre temporárias, mas nossa necessidade de suporte, de cuidados, diante deles, é sempre permanente.”
Ciro Floriani