Um encontro sonhado
Em tempo de incerteza deixamos de sonhar.
Atualmente temos pesadelos com duas doenças. Uma antiga – a ignorância – e uma nova, causada pelo Covid-19. Ambas trazem enorme apreensão, pois muitas pessoas têm medo de morrer se adquirirem essa nova virose, algumas têm receio de diminuir seus lucros e outras acham que há uma fórmula mágica que sirva para todos.
A ciência traz luz às trevas, e a epidemiologia é primeira página nos jornais, TV e internet. Seus heróis colocam as evidências científicas acima de vieses políticos ou econômicos, pesquisando as causas das doenças e aplicação de recursos disponíveis.
Com isso tudo na cabeça, sonhei com uma reunião incrível.
Lá estava Ignaz Semmelweis que em 1847, numa época em que nada se sabia sobre bactérias e vírus, demonstrou a importância de se lavar as mãos para diminuir infecções. Estava também John Snow, que descobriu o caminho da cólera ocorrida em Londres, inventando o geoprocessamento epidemiológico em 1854. Florence Nightingale contou como cuidou dos feridos na Guerra da Crimeia, em 1856, melhorando as condições sanitárias dos hospitais. Oswaldo Cruz falou da Guerra da Vacina, de 1904, quando foi considerado inimigo do povo. Richard Doll relatou como em 1954 provou que o fumo era responsável por diversos tipos de câncer. Li Wenliang, que, em 2019, já havia alertado sobre essa nova virose, sendo repreendido pelo governo chinês, era o mais jovem de todos os presentes.
Esse sonho teve alguns dos heróis que enfrentaram inimigos microscópicos, corporações poderosas e desinformação maldosa. Imagino seus medos de que, ao tomarem uma posição, poderiam estar errados ao discordar do senso comum num cenário repleto de evidências científicas incompletas e mutantes. Mantiveram suas posições. Tinham convicção de seu bom-senso.
Acordei feliz por ser um profissional da saúde.
Levantei e fui trabalhar. Outros profissionais precisam fazer o mesmo, para que nossa sociedade fique em segurança, tenha água, eletricidade, comida, medicamentos, equipamentos, para que os itens essenciais cheguem aos seus destinos, assim como as verdadeiras informações.
Diante das atuais incertezas, é fundamental que a maioria da população fique em casa. É uma temeridade agir de forma diferente. O presente não deve brigar com o passado, mas analisa-lo.
Quem decide pode errar, quem se omite ou foge à responsabilidades já errou. Um pesadelo real.
Alfredo Guarischi, Médico
Membro da Câmera Técnica de Segurança do Paciente do CREMERJ